terça-feira, 12 de abril de 2016

Natureza Das Coisas

(Arte: Zurco)
"Não sei muito sobre você e, provavelmente, você também não sabe muito sobre mim, mas isso parece se tornar irrelevante quando nos trombamos em olhares. Nós nunca conversamos sobre nós, apenas sobre coisas da vida e do nosso cotidiano, sendo sob a luz ou sob a escuridão. Nunca nos encontramos ou conversamos fora da Servidão Moderna, mas, em nossos frequentes (e inevitáveis) encontros oculares, discutimos sobre essa estranha circunstância. Existe algo que talvez você não saiba, então lhe direi e tentarei ser breve: não acredito nos relacionamentos amorosos, porém desde a nossa mística colisão, questiono tudo isso e a mim mesmo sobre tais 'aparências'.

Não sei se é o seu olhar. Não sei se é a simetria do seu rosto. Não sei se é o desenho do seu corpo. Não sei se é a sua voz e o seu jeito de se expressar. Não sei se te persuadi a tudo isso, ou se você me persuadiu a tudo isso. O fato é que não fizemos e não fazemos nada sobre nós, apenas nos confundimos e nos estranhamos rotineiramente.

Os dias passam, as horas voam e a cada milésimo de segundo, lentamente, nossos disfarces, nossos medos, nosso orgulho e nossa ignorância vão se quebrando e se dissipando diante da inevitável natureza das coisas."

Imovelável

(Arte: Jack Vettiano)

"Talvez tenha parado de falar acerca do amor, pois, quando nos olhamos, percebo que não há o que se explicar, nem como, nem porquê, apenas o fato que se encontra pairado e imóvel no espaço tempo entre o meu Eu e o seu Eu. Apreensivos por alguma reação astronômica que vá, finalmente, nos colidir em um grande e intenso evento existencial, esperamos".

Desrelacionamento

(Cena do filme Eyes Wide Shut)

A formalidade moral é a base de um aparente elo conjugal. O teatro de felicidade e sucesso também servem (e até, aparentemente, sustenta) a "relação", mas nada disso desmistifica a infelicidade de estar por estar de cada conjugue. "Estamos bem, graças a Deus!" é o que dizem quando não se tem mais o que se compartilhar, tão pouco sustentar, juntos. Um status virtual, uma aliança, um documento assinado pelos dois, um mesmo teto para dividir, um mesmo carro para compartilhar, o mesmo filho para gerar, a mesma conta para se administrar, a mesma vida para se viver, juntos. São "considerações" e maneiras de tentarem se prender, ou relacionarem o que nunca se relacionou. Entendendo que nada disso elimina, nem eliminará o fato de que, mesmo juntos - aparentemente juntos - não existe relação, não existe felicidade, mas um teatro, um disfarce, uma TRADIÇÃO pra se sustentar. Em meio a toda essa frenética e desordenada dança, dois indivíduos se destroem, dia após dia, crentes de que o amor é essa simbólica mistura de ciúmes, desconfiança, dor e sofrimento.

É assim que a gente faz quando não entendemos o que é estar só. É assim que a gente age quando achamos que estamos preparados para a vida. É assim que a gente age quando não conhecemos nem a nós mesmos.

No final das contas, grande parte do sofrimento humano é o mais puro e perturbante medo de lidar, dia após dia, consigo mesmo.